É tão bom quando a gente pede ajuda e a ajuda chega de uma boa vontade, vindo de quem se preocupa verdadeiramente com a gente. Estive passando mal hoje, com o corpo ruim e querendo dar febre, suportando uma dor nos olhos terrível e uma dor na coluna feito cólica menstrual fora de época; estive com fome, mas sem apetite, e no almoço não consegui comer. Após quatro horas sentada numa carteira, sentindo dor por ficar sentada, finalmente acabou a aula. Só que depois teve mais aula, e com isso, mais uma hora e dez minutos de dor, frio, desconforto. Minha cabeça estava leve, como aérea, e eu sentia que se não a segurasse, poderia se soltar do pescoço e sair voando por aí — dessa tontura que eu sentia, quase um desmaio que não poderia acontecer, pelo menos não segundo os meus padrões; nunca desmaiei, a despeito de situações de estresse físico e psicológico. E segui agitando os olhos, pois sentia-os doloridos e não tinha forças para mantê-los fixos em coisa alguma. As mãos geladas, eu as mantinha dentro da blusa de frio (que peguei emprestada pois havia esquecido a minha) numa tentativa de aquecê-las.
Mas tudo tem uma explicação, não fiquei assim de chofre. É que durante o fim de semana estive em uma terra fria, a terra de Drummond, com clima bem diferente daquele de meu habitát natural, Coronel Fabriciano, onde vinte e um graus é frio e dezesseis graus é luxo, temperatura que lá só ocorre uma vez por ano, durante uma madrugada de inverno em que alma alguma ousa sair de casa sem metros de agasalho. E então o estopim foi meu sono fragmentado de hoje e a correria que arrumei: tendo acordado já no minuto em que começava minha aula, saí de casa com muita pressa, sem ouvir meu corpo nem nada.
E então veio o mal-estar.
Ela tem alguma coisa muito distinta, essa pessoa, um talento único: o de entender. Mera troca de olhares basta para a gente se comunicar com Sara, e de tal simples troca ela consegue recolher informações, meio que lê a gente. Conheci poucas pessoas assim em pouco menos de duas décadas de vida. Ela tem alma, e se comunica com almas.
Dois dardos vazios sem alvo atirados ao vento, inócuos, pediam socorro.
Promessa de febre, sim, febre e doença e desânimo e desmaio e pouca fome e emagrecimento. Por Deus, odiaria emagrecer, principalmente porque começaria a ouvir elogios das pessoas por ter um corpo mais magro sendo que emagreci porque estava doente. Vou exagerar: deveriam criar um decreto de lei proibindo as pessoas de elogiar umas às outras por causa de medidas menores. Tão fútil — não, nada fútil, porque é uma trivialidade que está arraigada com tanta força no nosso conjunto de valores que leva muitas pessoas a se acharem erradas e tentarem corrigir o erro se mutilando, se machucando — porque não ouvir o próprio corpo e deixar de se alimentar para tentar corrigir os supostos defeitos dele é uma forma de automutilação. Dieta? Compulsão, medo, culpa. Cortar? Depois, devorar. E se punir. Por quê? Por que as pessoas se submetem a atentados contra elas próprias tentando alcançar uma imagem física ideal?
Ah, que se exploda. Um pensamento leva a outro, não sei nem como vim parar aqui se estava falando sobre ajuda. Pois uma das coisas mais singelas da vida é quando se pede ajuda e ela vem de mãos abertas. E uma das coisas mais profundas da vida é quando o outro simplesmente entende. Não precisei me explicar. Não revirei os olhos, mas através deles transpareci meu mal-estar. Eu estava pedindo ajuda quando olhei diretamente para ela. E sabia que a receberia quando ela franziu a testa, sinal de preocupação. E havíamos nos comunicado, sem palavras, num encontro que durou um segundo. Ela cuidou de mim como uma mãe, e de pouquíssimas pessoas posso dizer isso.
Afinal, eu era como um animal internamente ferido, mudo de palavras humanas, e ela foi alguém que compreendeu. É isso. Simplesmente entender.
7 de maio de 2018
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